O encanto e o descaso de um sonho de Natal: o carpinteiro que constrói a casinha do Papai Noel e descansa em uma rede na praça da Revolução
Na Praça Plácido de Castro, no coração de Rio Branco, o martelar constante anuncia que o Natal se aproxima. Sob o sol forte e o calor da capital acreana, um carpinteiro trabalha de sol a sol para erguer a tão comentada “casinha do Papai Noel”, organizada e projetada pela Prefeitura de Rio Branco.
Mas o que chama atenção desta vez não é o valor exorbitante da obra, tema que, aliás, merece um debate à parte, e sim a realidade de quem a constrói. Em meio à pressa da entrega e à rotina exaustiva, o trabalhador busca alguns minutos de descanso no intervalo do almoço. Para isso, arma uma pequena rede entre as mangueiras da praça, tentando encontrar abrigo na sombra, enquanto a cidade segue o fluxo ao seu redor, indiferente à cena.
Essa imagem deveria nos constranger. No mesmo espaço em que se ergue um símbolo de fantasia, alegria e esperança, há um homem que encarna, com dureza, a face real do trabalho braçal: o cansaço, a falta de estrutura e o esquecimento. O carpinteiro que dá forma ao cenário do Natal talvez nunca entre na casinha que ajudou a construir; talvez nem tenha tempo para levar seus filhos para ver as luzes que montou com as próprias mãos.
Há algo de profundamente contraditório nisso. O Natal é, ou deveria ser, tempo de empatia, de afeto, de valorização da dignidade humana. No entanto, o que vemos é o reflexo de uma gestão pública que celebra o encantamento, mas ignora a humanidade de quem o torna possível.
A rede estendida na calçada da praça é, ao mesmo tempo, abrigo e denúncia. Ela revela a distância entre o discurso festivo e a realidade do trabalhador comum aquele que constrói os sonhos dos outros, mas não tem direito nem ao próprio descanso digno.
É urgente que se olhe com atenção para esses profissionais. Que a Prefeitura de Rio Branco e qualquer administração pública que se orgulhe de promover o espírito natalino compreenda que não há magia verdadeira quando falta respeito à dignidade do trabalho.
Porque o verdadeiro Natal não se constrói com madeiras e luzes. Constrói-se com humanidade.