Em 2024, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) registrou pagamentos líquidos de até R$ 349 mil em um único mês a ministros aposentados, impulsionados por benefícios adicionais conhecidos como “penduricalhos”, conforme dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Embora a remuneração média anual desses magistrados aposentados não ultrapasse significativamente o subsídio mensal padrão, parcelas adicionais elevaram consideravelmente os rendimentos em meses específicos.
Situação semelhante foi observada no Tribunal Superior do Trabalho (TST), onde, em dezembro de 2024, 26 dos 27 ministros receberam remunerações líquidas superiores a R$ 250 mil, alcançando uma média de R$ 357 mil por magistrado. O ministro Sergio Pinto Martins liderou com um rendimento líquido de R$ 419 mil no período.
No Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), os gastos com penduricalhos aumentaram mais de 50% em 2024, resultando em uma remuneração média de R$ 75 mil mensais para seus cerca de 380 desembargadores ativos. O salário-base desses magistrados é de R$ 37,6 mil, mas os pagamentos adicionais quase dobraram esse valor.
Esses pagamentos extras incluem gratificações, indenizações e vantagens pessoais ou eventuais, todas permitidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e não contabilizadas no cálculo do teto salarial do funcionalismo público. Entre os principais itens que elevam a remuneração estão o abono de permanência, destinado a quem já pode se aposentar mas opta por continuar na ativa, e a parcela de irredutibilidade, benefício pago a magistrados que, em 2007, recebiam mais do que 90,25% do salário dos ministros do STF.
O aumento nos gastos também é atribuído ao pagamento de valores atrasados decorrentes de demandas judiciais feitas pelos próprios magistrados, reivindicando direitos retroativos, incluindo diferenças salariais da década de 1990. O TJ-SP afirmou que esses pagamentos possuem respaldo em decisões do STF e do CNJ e incluem até mesmo férias não pagas.
Em meio a pressões por redução das despesas públicas, o governo federal propôs, no fim de 2024, a criação de uma lei complementar para regulamentar os penduricalhos e evitar supersalários no funcionalismo público. No entanto, o relator da proposta, deputado Moses Rodrigues (União Brasil-CE), cedeu à pressão de entidades de classe da magistratura e de outras categorias, retirando a proposta do texto final.
Dados do Atlas do Estado Brasileiro, produzido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), mostram que o Judiciário é o Poder com melhor remuneração do país. Em 2022, os 10% mais bem pagos do Judiciário, incluindo magistrados e servidores, tiveram rendimentos médios de R$ 26,2 mil, enquanto os 10% mais bem pagos do Executivo receberam R$ 9.300.
Especialistas apontam que, desde os anos 1990, o Judiciário vem ganhando maior autonomia orçamentária, o que contribuiu para o aumento de sua remuneração e para a institucionalização de benefícios adicionais acima dos limites estabelecidos. O pesquisador Felix Garcia Lopes, do Ipea, afirma que o Judiciário desenvolveu uma expertise avançada em produzir esse tipo de burla e está lutando no Congresso Nacional para evitar que uma legislação mais rigorosa seja aprovada.
A discussão sobre os penduricalhos e os altos salários no Judiciário brasileiro continua gerando debates sobre a necessidade de regulamentação e transparência nos gastos públicos, especialmente em um contexto de busca por equilíbrio fiscal e justiça social.