Rio Branco, AC, 12 de junho de 2025 02:27
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Fantástico expõe precariedade extrema em escola no interior do Acre que funciona em curral improvisado

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No coração da floresta amazônica, no município de Bujari, interior do Acre, estudantes da comunidade rural do Limoeiro vivem uma realidade escolar que, ao ser exibida no programa Fantástico, comoveu e revoltou o Brasil. O espaço onde estudam não tem paredes, piso ou água encanada. Na verdade, o que deveria ser um ambiente de aprendizado é, literalmente, um antigo curral.

A rotina dos alunos, no entanto, é de uma dedicação comovente. Todos os dias, a jovem Janaína cavalga por uma hora até o local de estudo improvisado. Kayane, sua irmã gêmea Kemele e a amiga Ana Cláudia caminham por longas distâncias a pé, enfrentando sol e lama, para chegar ao que a comunidade batizou de “escola sem paredes”.

Lá, a professora Graciele ensina sozinha turmas multisseriadas nos dois turnos. Ela também é responsável por preparar a merenda dos alunos, já que a unidade não conta sequer com uma servente. E como não há refeitório, os próprios alunos se revezam para ajudar: Kayane, por exemplo, além de aprender e corrigir os cadernos, lava a louça e, às vezes, limpa a panela usada para preparar o alimento do dia.

Não há recreio. O intervalo é dividido entre as tarefas domésticas e a esperança de dias melhores. “Vale a pena continuar nessa luta?”, pergunta a reportagem. Kayane responde com fé: “Vale, pela fé. Eu vou me formar em Pecuária e Veterinária. Gosto muito.”

A força dessas crianças ecoa entre os moradores. A comunidade se uniu em um mutirão para manter viva a educação local, mesmo com recursos escassos. A água usada na escola vem da casa de um vizinho, que doa o que pode para manter o funcionamento do anexo improvisado. O banheiro, recém-construído, funciona com baldes d’água, uma vez que não há encanamento.

A justificativa das secretarias estadual e municipal de Educação para essa situação é que os estudantes não conseguiam chegar até a sede da escola rural, a 10 km dali. O antigo curral foi, então, adaptado como um anexo da unidade principal. 

No entanto, quando a equipe de reportagem foi visitar a sede, encontrou o local fechado. Funcionários limpavam o espaço, mas não havia aula. Dois dos três banheiros estavam interditados, as paredes descascadas e materiais didáticos cobertos de traças e teias de aranha.

De acordo com a Secretaria de Educação, a escola estava sem energia elétrica naquele dia. A coordenadora da parceria entre Estado e Município, Rocilda Gomes — que também é esposa do prefeito de Bujari — afirmou ter sido contra a retomada das aulas no antigo curral após as férias de maio. Disse que os pais insistiram na continuidade, por não haver alternativa.

“Tanto que eu até pedi pra suspender as aulas, porque agora só vai iniciar quando tem o término da escola do município”, disse Rocilda. 

Um novo anexo, com paredes de madeira, está sendo planejado para a região. Segundo a secretaria estadual de Educação, a previsão de entrega é de cerca de 40 dias. Até lá, as aulas no curral continuam.

“Temos um prazo de 40 dias para entrega. (…) O custo da educação no campo é muito alto”, afirmou.

Mas, por enquanto, as aulas no antigo curral continuam. “Não serão suspensas. (…) Temos um calendário a cumprir. Um dia de verão é precioso, porque, no inverno, não tem aula”, afirmou. 

Apesar da precariedade, os sonhos seguem firmes. Tiago, filho de William — um dos pais que ajuda na manutenção do espaço —, sonha em ser policial. Kayane e Kemele falam em estudar Direito. 

A professora Graciele, símbolo da resistência, resume: “Meu sonho é permanecer, ser feliz e continuar trabalhando.” E completa, emocionada: “Eu sou a base aqui.”

Em meio à lama, ao calor, à ausência de estrutura mínima, o que não falta ali é vontade de aprender. Na escola sem paredes, o chão é de terra, mas os sonhos são sólidos como concreto. E são esses sonhos que, dia após dia, sustentam a esperança de uma educação mais justa no Brasil profundo.